segunda-feira, 15 de setembro de 2014

542 - «UM CAMINHO DE PALAVRAS» - ANTÓNIO RAMOS ROSA

542

UM CAMINHO DE PALAVRAS

     Sem dizer o fogo -- vou para ele. Sem enunciar as pedras,
sei que as piso  -- duramente, são pedras e não são ervas.
O vento é fresco: sei que é vento, mas sabe-me a fresco ao
mesmo tempo que é vento. Tudo o que sei, já lá está, mas
não estão os meus passos nem os meus braços. Por isso cami-
nho, caminho, porque há um intervalo entre tudo e eu, e
nesse intervalo caminho e descubro o meu caminho.

       Mas entre mim e os meus passos há um intervalo tam-
bém: então invento os meus passos e o meu próprio caminho.
E com as palavras de vento e de pedras, invento o vento e as
pedras, caminho um caminho de palavras.

                             Caminho um caminho de palavras
                             (porque me deram o sol)
                             e por esse caminho me ligo ao sol
                             e pelo sol me ligo a mim

                             E porque a noite não tem limites
                             alargo o dia e faço-me dia
                             e faço-me sol porque o sol existe
                             
                             Mas a noite existe
                             e a palavra sabe-o

ANTÓNIO RAMOS ROSA

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